VV apresentada em duas instituições distintas

22-05-2012 19:19

7ª - SEMINÁRIO do Instituto Superior de Comunicação,

no curso superior de comunicação social, cadeira semestral de “Marketing Político” em representação da Associação Portuguesa de Profissionais de Marketing, 2001, Lisboa.

e

8ª - III encontro Luso-Brasileiro de Municípios com Potencial turístico, promovido pelo IAFE (8 de Junho 2006)

 

Autor: Dr. Oliveira Dias


 

Marketing Religioso

ÍNDICE

Os 5 P’s do Marketing…… …………………………………………..

Os 5 P’s aplicado ao Marketing Religiosos e eleitoral ……………

Ferramentas da comunicação : publicidade e propaganda …………..

Case Study “As indulgências Católicas”

Quadros …………………………………………………..………….

Bibliografia ……………………………………………..…….……..

 

Os 5 P’s do Marketing

Quem já não ouviu falara dos 4 P’s do Marketing, ou mais concretamente o “Mix do Marketing”?

Product, Price, Place e Promotion são os quarto pilares do Marketing sendo a sua tradução: Produto, Preço, Distribuição e comunicação.

Desde sempre os marketeiros lusófonos se referem a estes 4 pilares como os 4 P’s em lugar dos termos em português – PPDC – como aliás seria natural.

Pouco relevante no entanto a terminologia, mais importante porém é que estes 4 pilares avançados por Kottler o “pai” do Marketing estão, por parodoxal que possa parecer, incompletos … pois falta o pilar mais importante – o Consumidor, ou Cliente, ou se quiserem ainda a PESSOA (Parson, se optarmos pelo anglicanismo), na estrita medida em que é o destinatário final.

Kottler defendeu os 4 P’s mas eles são 5, sendo que para Kottler diria: Product, Price, Place, Promotion anda Parson. Para os lusófonos diremos antes: Produto, preço, distribuição, comunicação e pessoa.

Porque não cliente ou consumidor ? porque o destinatário final nem sempre é um cliente ou um consumidor. Na verdade quando o destinatário final é um Utente, isto é, um utilizador de um serviço público, este não é um cliente, porque não compra algo com um determinado lucro incorporado, mas sim apenas paga uma taxa, a qual por definição não tem incorporado o lucro.

Assim Pessoa tanto é um cliente como um utente em função do bem a que tem acesso como até pode ser as duas coisas.

Tudo gira, pois em torno das pessoas, sem as quais nada mais teria significado no marketing, e dentro deste, da Publicidade.


 

Os 5 P’s aplicado ao Marketing Religiosos e eleitoral

No marketing religioso estes pilares serão diferentes ? A sistematização obedecerá à mesma estrutura dos 5 P’s ? Vejamos:

Product (Produto) – não é um produto mas uma filosofia de vida portanto valores;

Price (Preço) – não existe um preço, não se compra nada, aceita-se algo – a fé, o dogma.

Place (Distribuição) – a rede de distribuição é o conjunto das paróquias.

Promotion (Comunicação) – esta é garantida pelas homilias, as missas.

Parson (Pessoa) – é claramente o Crente.


 

 

Mix do Marketing Tradicional

Mix do Marketing Religioso

Mix do Marketing

Eleitoral

1º pilar Produto

1º pilar Valores

1º pilar Programa eleitoral

2º pilar Preço

2º pilar Fé

2º pilar Voto

3º pilar Distribuição

3º pilar Paróquias

3º pilar Mesas de Voto

4º pilar Comunicação

4º pilar Homílias (missas)

4º pilar campanhas eleitorais

5º pilar Pessoa (cliente)

5º pilar pessoa (crente)

5º pilar pessoa (eleitor)

Tudo o resto são estratégias comunicacionais aplicadas com recurso a ferramentas como a publicidade e a propaganda. Mais esta do que aquela, pois a publicidade enquanto ferramenta do mix da comunicação só aparece em finais do século XIX, ao passo que a propaganda é utilizada, pelas religiões, desde sempre.

Não esqueçamos que a diferença entre a publicidade e a propaganda é que a primeira tem por objectivo persuadir o consumidor a adquirir um produto comercial, ao passo que a propaganda tem por fim último a persuasão da pessoa a aceitar uma ou mais ideias ou ideologias independentemente da bondade destas.


 


 

Ferramentas da comunicação : publicidade e propaganda

Ferramenta do MIx de Marketing tradicional

Ferramenta do MIx de Marketing Religioso

Ferramenta do MIx de Marketing Eleitoral

Publicidade

Propaganda

Publicidade a)

E a Propaganda

  1. esta é claramente proibida pela legislação em vigor, mas a verdade é uma grande disseminação e vulgarização desta ferramenta em períodos eleitorais.

O Marketing enquanto área do saber cientifico, hoje desafectado do restritivo enquadramento meramente mercadológico, como o era no inicio do século XX, transformou-se numa disciplina abrangente, num sentido lato do próprio termo Marketing, significando cada vez mais Marketing Politico.

Por sua vez também o termo Política já não é um apanágio das lides partidárias ou militantes de determinadas apologias políticas, ou doutrinas sociais, pugnadas por diversos autores e actores da cena político-partidária passada e actual.

Política será então tudo aquilo que directa ou indirectamente diz respeito às relações interpessoais e intergrupais de determinado colectivo designado por sociedade humana.

O Marketing Político será então uma área do saber cientifico que trata os esquemas comunicacionais entre grupos e indivíduos qualquer que seja a sua esfera de acção.

Das muitas variantes possíveis do Marketing Político é possível destacar o Marketing Religiosos, presumo, não sem alguma surpresa para alguns espíritos mais conservadores.

Aparentemente poder-se-ia pensar não ser esta área – a religião – passível de enquadrar numa qualquer classificação ligada ao Marketing, derivada à forte conotação deste termo com o lucro, visado pelos esquemas de comercialização ao qual se encontra inevitavelmente ligado.

Porém, como se disse, não estando o Marketing Político subordinado unicamente ao desiderato comercial, sendo pelo contrário bem mais lato, consequentemente o Marketing religioso nada terá a ver com o lucro ou comercialização de um produto.

Tem, isso sim, a ver com uma estratégia comunicacional cujo objectivo será o alcançar de uma meta bem definida, a fim de servir determinados fins, no caso o fim visado é de carácter eminentemente religioso.

Case Study “As indulgências Católicas”

Dos muitos “”case study” passíveis de análise procurar-se-á nestas linhas direccionar o estudo para aquela que é a maior religião à escala planetária, não por nenhuma razão especial, mas sim porque até foi das primeiras a utilizar o Marketing Religioso - a Igreja Católica.

Também aqui as possibilidades de isolar algumas acções desenvolvidas pela igreja, ao longo dos séculos, dão-nos um campo fértil de análise, impondo-se, pois, a restrição a um dos aspectos possíveis – as indulgências.

As indulgências religiosas praticadas pela igreja católica cifraram-se por uma estratégia comunicacional (Marketing) à escala mundial fabulosa, cujos objectivos não só obtiveram plena eficácia como perduram ao longo dos séculos até hoje.

Vejamos o significado deste instituto do Direito Canónico, proveniente do latim indulgentia.

A indulgência é o perdão de uma pena temporal imposta pela infracção do mandamento “não pecarás” cometida por um servo de Deus. Por outras palavras é a absolvição do pecador por um ministro da igreja, do pecado cometido.

Esta absolvição assume duas formas a plenária, se a absolvição é total, e parcial se a absolvição se refere a apenas parte do pecado. Distinguiam-se ainda em reais, locais e pessoais, consoante se tratassem ou referissem a um objecto de devoção, a um lugar determinado, ou a certas boas obras pessoais respectivamente.

De resto esta foi e é uma prática antiquíssima, na igreja católica.

Do século II ao século IV consistia na mitigação da penitência pública, pelos pecados cometidos. Do século VII ao século XI as indulgências serviam para comutar a penitência canónica em obras mais fáceis, como a obrigação de fazer peregrinações ou visitas a basílicas.

A partir do século XI as indulgências começam a ser atribuídas a quem praticasse certas obras pias cujo objecto era já a promoção das expedições à Terá Santa, isto é, para combater os infiéis muçulmanos e demais hereges da altura.

No século XIV a igreja institui o Jubileu como indulgência plenária devendo ser celebrada todos os 50 anos, reduzindo-se posteriormente para os 25 anos.

Presume-se ter esta redução temporal a ver com a esperança média de vida que dificilmente ultrapassava os 35 anos1.

Os Jubileus extraordinários surgiram naturalmente, sendo a possibilidade de se jubilar mesmo antes dos 25 anos, sucedendo-se igualmente os jubileus parciais a par dos já existentes jubileus plenários.

Esta prática do instituto da indulgência sob as mais variadas formas: indulgência plenária e parcial, jubileu plenário e parcial, jubileu extraordinário plenário e parcial, consistia numa prática desde sempre utilizada no seio da igreja.

Certo era que “clientes”, leia-se almas carentes de absolvição, eram-no quase todos os crentes, pois de uma forma ou de outra o povo, do mais rico ao mais pobre, não estavam isentos de cair em tentação e praticar o pecado, face às múltiplas e variadas formas assumidas pela tentação a que o comum mortal estava sujeito.

Tendo presente esta oportunidade (os crentes pecadores em número de milhões) o Papa Leão X faz publicar em 1517 uma Bula Papal feita pelo frade dominicano João Tetzel sob a protecção do arcebispo Alberto de Magdeburgo, pela qual vendia as indulgências Papais.

Com isto o Papa pretendia angariar fundos que lhe permitissem concluir a construção da majestática basílica de S. Pedro. O que de resto conseguiu. Tal como conseguiu arranjar um dote para a sua irmã Margarida de Médicis.

As resistências a esta prática não se fizeram esperar, pela mão de Lutero e da problemática reforma por este levada a cabo num combate sem trégua ao Papa Leão X.

Este 43 anos mais tarde, em Trento, define as indulgências como um auxilio às almas no purgatório, obtido pelos fiéis e pelas missas, evitando assim que aquele instituto assumi-se a forma de absolvição de pecados.

Os fundos porém continuavam a entrar nos cofres da igreja, pois a indulgência – perdão pago mediante entrega de determinada quantia à igreja – transformara-se já num hábito para os pecadores que dessa forma aliviavam os seus espíritos pelos pecados cometidos. Mais. Não havendo limite para a compra de indulgências todos os pecados cometidos ou a cometer no futuro sempre tinham a possibilidade de serem perdoados, para tanto houvesse dinheiro e tal não constituiria problema .

Os teólogos da igreja sempre fizeram um esforço no sentido de provarem que a indulgência não se tratava do perdão de pecados, de forma a atenuar as criticas dos protestantes.

Porém o Papa Bonifácio VIII promulga uma bula na qual expressamente afirma que a indulgência é a concessão de um perdão de todos os pecados.

O Papa Clemente VI promulga também uma bula na qual proclama que quem ganhar uma indulgência alcança o mais completo perdão de todos os seus pecados.

O Papa Sixto IV promulga uma outra bula em que as designa como “indulgências remisso de pecados”.

Obviamente que estas bulas papais sucessivas se destinavam a garantir a confiança no “produto” incrementando-se assim a compra de indulgências, enchendo os cofres da igreja, tão carenciada pelas vicissitudes próprias de uma Europa fechada sobre si mesma.

Esta prática das indulgências era seguida não só pelos fiéis individualmente como também se aplicava aos Reis e respectivos Reinos. O Poder Papal sobrepunha-se ao Poder Real muitas vezes, mesmo quando o papa tinha a mesma nacionalidade do Rei com quem entrava em litígio2.

Veja-se o caso português, para além das moedas em ouro pagas por D. Afonso Henriques para reconhecimento da sua condição de rei de Portugal (Portucale), no século XII o Papa Celestino III dirige uma Bula a D. Sancho I, em 1197, na qual confere indulgências a quem combatesse o Rei de Leão (Espanha), à época aliado dos Sarracenos. Estas indulgências eram as mesmas concedidas a quem na Península Ibérica combatesse os infiéis. O Rei Português tinha assim um duplo perdão: por um lado por combater o Rei de Leão e por combater os sarracenos.

Ressalvados os paralelismos e as distâncias, isto fica muito próximo do já conhecido “dois em um” que muitas estratégias comunicacionais difundem junto dos consumidores.

A prática destes indultos prosseguiu nos séculos seguintes, com algumas modificações quanto à forma, introduzida pelos sucessivos Papas, até que Bento XV introduz uma inovação, as indulgências ao reino de Portugal seriam renovados de 10 em 10 anos.

Estas renovações automáticas duraram até 1944 data em que o Papa Pio XII prorroga por um período de apenas 5 anos, isto é até 1949.

Refira-se finalmente que as indulgências eram taxadas em função dos rendimentos dos crentes, fossem eles pessoas ou Reinos. Está bem de ver que na época áurea dos descobrimentos os países da península ibérica eram os mais abastados, logo os maiores contribuintes da igreja, via indulgências.

Numa perspectiva de Marketing Religioso as indulgências foram efectivamente uma acção ímpar, quer pelos resultados obtidos quer pela duração dessa acção, iniciada no século XII ainda hoje perdura.

A visão do Papa Leão X foi uma visão de um autentico técnico de Marketing, pois soube aproveitar uma situação de vantagem, os crentes e a influência sobre os mesmos, com uma prática já seguida, as indulgências, mas da qual só os próprios tiravam benefícios – a absolvição, o perdão pelos pecados praticados, e transformou-as num vasto beneficio financeiro para a igreja, mercê do qual transformou numa potência ímpar cujo império abarcavam todos os Reinos da Europa, à época o mundo conhecido.

Não se pense porém que esta visão da igreja não teve seguidores nos tempos mais recentes.

Se em várias matérias se diz que a igreja não tem acompanhado a evolução dos tempos, já o mesmo se não pode dizer sobre as formas de auto financiamento, aproveitando as oportunidades ditadas pelas contingências da moda.

O fim do século e do milénio foram disso uma prova eloquente. Com ele a azáfama comercial em torno do acontecimento ímpar diz-se sentir com bastante antecedência.

A igreja viu, e bem, aqui uma oportunidade de arrecadar alguns cobres aproveitando a era das novas tecnologias e da electrónica, por um lado e por outro, prevendo um afluxo anormal de peregrinos ao Vaticano, isto é, de potenciais clientes.

Daí até ao cartão de peregrino foi um pequeno passo. De facto ao serem esperados vários milhões de peregrinos num ano que até era um ano de jubileu, a oportunidade era única.

Aquele cartão era um vulgar cartão magnético, tipo Multibanco, com funções de débito, portanto bastante familiar para o utilizador que não teve problemas no seu manuseamento, sendo-lhe entregue assim que desembarcava em Itália.

Este cartão magnético – cartão peregrino – era no fundo um cartão multiusos: serviu como ingresso nos eventos promovidos pela Santa Sé, serviu como passe nos transportes públicos, serviu como credifone nas 130 mil cabinas especialmente montadas para o efeito, serviu como cartão desconto na aquisição de certos bens alusivos, e serviu finalmente como base de dados para cadastramento, isto é, o cartão peregrino contendo dados pessoais, muito completos que permitiu às autoridades fazer vários tipos de controle, entre eles os relacionados com a segurança.

Se pensarmos que o Marketing em geral utiliza as técnicas em função de “targets” (alvos) específicos com objectivos determinados, nisso encontrando a fundamentação dos “segmentos de mercado” as demais áreas específicas, também elas segmentos de estratégias comunicacionais, estão sujeitas às mesmas regras, ou princípios.

Isto é, o retumbante êxito das indulgências também tem que ver com a segmentação do mercado possibilitado por este “produto”. Na verdade recentemente, precisamente no ano do jubileu um prelado português, concretamente D. jacinto Tomás de carvalho Botelho, da comissão Nacional do Grande Jubileu, defendia, em artigo publicado na imprensa, os Jubileus Sectoriais.

Estes jubileus sectoriais seriam então a celebração do grande jubileu por sectores, 3 fossem eles profissionais, sociais, etc. Utilizando outra linguagem, dir-se-ia então que o “produto” chamado jubileu, cuja vantagem se traduzia num perdão generalizado para o pecador (cliente), podia ser feito por nichos de mercado, tantos quantos os diversos segmentos possíveis de identificar.

O referido prelado sugeria até que a segmentação podia fazer-se por áreas laborais, uma vez que aí se podem encontrar vários tipos de atropelos, à dignidade humana entre outras, e portanto um campo fértil a ser explorado.

Se existem técnicas de Marketing e estratégias de comunicação visando um objectivo, o cartão do peregrino foi um deles.

Fim


 


 


 


 

1 Presunção do autor

2 Veja-se o exemplo do Papa Português Hispano I, que litigou contra o pai do rei D. Dinis, D. Afonso IV.

3 Nichos de mercado ou “clusters”