32º Colóquio APQ

22-05-2012 19:32

“Excelência o Sorriso do Sucesso”

Município de São Vicente, Promovicente, Madeira

Comunicação Livre – Qualidade Municipal em Portugal

Autores: José António Rajani Oliveira Dias

(esta comunicação não foi considerda pela APQ)


 

 

 

As transformações políticas, sociais e económicas de que Portugal foi objecto nos últimos anos, criaram novos pólos de desenvolvimento de que resultaram novos núcleos urbanos ou o crescimento rápido e não sustentado dos já existentes, criando novas necessidades e abrindo novas perspectivas, suscitando outras respostas para uma população mais exigente, mais informada e formada e mais reivindicativa em relação ao desempenho das autarquias locais.

Estas transformações, por demais evidentes, têm sido pontualmente acompanhadas por uma reforma da legislação aplicável ao sistema administrativo público. A título meramente exemplificativo, refira-se a legislação respeitante à modernização administrativa, às competências e funcionamento dos órgãos das autarquias locais, finanças locais, transferência de atribuições e competências para as autarquias locais, Estatuto dos Eleitos Locais, associações de municípios ou de freguesias, empresas municipais e intermunicipais, para apenas citar a legislação subjacente mais relevante. Esta dispersão legislativa tem vindo a criar aos vários protagonistas (eleitos locais, funcionários autárquicos e cidadãos.) dificuldades várias na aplicação do direito com a consequente insegurança e incerteza, provocando, em vários momentos, uma séria instabilidade na identificação dos seus verdadeiros sentidos e alcance, registando-se frequentemente embora de forma não intencional, o registo de ocorrências ilegais, como de resto sempre acontece a quem tem de lidar com vários instrumentos legislativos, pois a isso obriga o principio da legalidade, em Portugal1. É um desafio.

E desafio porquê? Porque daqui resulta a elaboração de um modelo teórico de Gestão Municipal2, com base no referencial normativo indicado e tendo em consideração três aspectos fundamentais; - o legislativo; a postura (comum!) dos cidadãos portugueses face à Administração Pública e a componente política que a gestão municipal comporta.

Por outro lado não devemos esquecer que a sua missão, visão, valores e objectivos são claramente divergentes se comparados aos do sector privado. Neste, impera a concorrência num mercado global e globalizante. Numa autarquia municipal estes conceitos consideram-se… “Não Aplicáveis”.

A qualidade não se limita à mera emissão de papéis, deve ser “interactiva” ou seja, ser um momento constante de partilha de saberes e experiências de/entre/e para - pessoas. Encarando a modernização administrativa como um objectivo tangível, depara-se-nos outro intangível, o de criar uma nova atitude no serviço público entre Autarquia Municipal-Cidadão-eleito Local.

A qualidade é hoje universalmente reconhecida e aceite como a satisfação do destinatário final3 em que a relação benefício/custo deve ser adequada, tornando-se um imperativo para todas as organizações públicas e privadas, face à crescente consciencialização que os destinatários finais, de bens ou serviços, possuem dos direitos que lhes estão atribuídos.

Mais do que uma nova teoria, a qualidade não se impõe por decreto, deve ser um “estado de espírito” ou “uma maneira de estar” para qualquer organização que queira sustentar a sua existência no mercado ou, no caso da Administração Pública (AP), prestar um papel social.

Em boa hora, esta evidência tem-se tornado num movimento do tipo e efeito “bola de neve”.

Poderá a AP ignorar uma nova cultura, consubstanciada pelos constrangimentos a que está sujeita, como qualquer outro agente da sociedade, característica dos tempos modernos ? o recurso a métodos de gestão e funcionamento, sistemas de organização e princípios de legitimação, visando a melhoria da qualidade dos serviços prestados aos cidadãos, à comunidade e à acção governativa, pode ser ignorado ? Claro que não.

É já amplamente reconhecido que a administração pública e a gestão privada comungam das mesmas necessidades organizacionais. Isso está claro, por exemplo, num dos congressos da Organização Iberoamericana de Cooperação Internacional, realizado em Lisboa em 2000, numa das intervenções “ Hoy en dia las administraciones públicas se acercan cada vez má a los modelos de actuación de las administraciones privadas...4

A ideia de qualidade nos serviços públicos é hoje um imperativo em Portugal, quer porque os cidadãos são cada vez mais exigentes em relação aos serviços que a Administração Pública lhes presta, quer porque os funcionários e agentes aspiram a que o seu trabalho seja mais responsável, mais gratificante e mais rico sob o ponto de vista do seu conteúdo funcional. Esta, porém é encarada frequentemente como uma burocracia mais. A burocracia é uma ciência em crise como ressalta da seguinte afirmação “La evidente crisis del sistema burocrático, com la consiguiente necessid de encontrar um modelo que lo sustituya, obliga al empleo de nuevos instrumentos ...” 5

Além disso, os custos económicos e sociais resultantes da ausência de qualidade dos serviços públicos são cada vez maiores e mais pesados para o cidadão e para os agentes económicos. Não é sustentável manter por muito mais tempo a convicção que ao dinamismo das empresas, correndo contra o tempo em busca da qualidade, se contrapõe uma Administração Pública paralisante, formalista, desmotivada, de modelo burocrático, muito pouco preocupada com a ideia da qualidade do serviço prestado e alheia ás realidades das suas congéneres europeias.

A AP, quer pelo volume de colaboradores que enquadra6, quer pelas verbas orçamentais que movimenta, é uma importante organização produtiva, influenciando directa ou indirectamente toda a nossa economia.

Felizmente já se observam, de há alguns anos a esta parte, sinais de mudança, quer na publicação de lei específica quer na certificação de alguns serviços públicos. Por isso, não faria sentido que se ignorasse a dinâmica europeia e mundial para a qualidade, pois condenaria o País a mais um atraso progressivo e irreversível em relação aos países que já implementaram esta prática de gestão.

Dependendo esta dinâmica de programas governamentais e os governos como sabemos são sucedâneos, espera-se, que no estabelecimento de prioridades, a gestão para a Qualidade Total seja considerada. Os cidadãos esperam que isso seja feito. Cabe à Administração mostrar que é capaz de responder ao desafio e de melhorar continuamente acompanhando o movimento da qualidade de uma forma planeada e sustentada.

Neste sentido, considera-se fundamental criar uma dinâmica conducente à implementação de um sistema de qualidade em serviços públicos, que encare a busca da qualidade na base de uma actuação consistente e transparente, definindo a sua estrutura, os órgãos que o compõem, as regras por que se rege, os critérios em que deve assentar e estimulando práticas de qualidade em todos os serviços públicos, tudo com o objectivo de institucionalizar uma nova cultura de gestão da AP.

Para tanto são necessários recursos humanos capazes “ ... gerentes competentes ... determinará la calidad de la actuación del Municipio ..7

Nesse sentido, a certificação não é o culminar de um processo, mas sim, assumir um compromisso público que determina uma exigência e melhoria contínua, assente no envolvimento de todos os interessados e orientada para o Cidadão em particular. Certificar uma Autarquia Municipal é o princípio e não o fim de um ciclo de modernização que se pretende quer a nível interno quer externo.

Os eleitos locais desempenham um papel determinante “ La nueva gerencia municipal debrá re4sponder a la creciente exigencia de su exclusiva competencia, y en la eficiente coordinación y control de calidad en los servicios ...”8

Não se apontam, neste trabalho, práticas ou caminhos sobre o que deveria ser uma suposta reforma do sistema administrativo ao nível de uma autarquia local. Trata-se de conceptualizar um modelo de gestão com base na ISO 9001:2000, conducente à atribuição de uma certificação. Porem e porque de estruturas distintas se trata este normativo internacional só pode ser aplicado se forem introduzidas adaptações atendendo a especificidade das entidades municipais. Esse esforço de adaptação pretende ser o resultado final deste trabalho. Embora muito condicionado pela legislação aplicável às autarquias locais, tentar-se-á demonstrar a mais-valia da implementação de um Sistema de Gestão da Qualidade (SGQ) que será parte integrante do processo de gestão das organizações municipais. Neste pressuposto dever-se-á atender ao seguinte:

  • Definir uma política e estratégia da qualidade;

  • Definir os processos mais significativos e respectivos indicadores para monitorização;

  • Implementar os objectivos decorrentes dessa política;

  • Definir os meios necessários para garantir que os objectivos sejam atingidos.

Neste pressuposto, há ainda que definir quem liderará este processo, se os:

  • Órgãos Executivos - Junta de Freguesia/Câmara Municipal ou o Órgão Deliberativo – Assembleia de Freguesia/Assembleia Municipal ou ambos.

e ainda, enquadrar a responsabilidade tutorial do SGQ quanto ás seguintes varáveis:

  • Definição; Gestão das Pessoas; Sensibilização; Gestão de Recursos; Implementação; Realização; Controlo dos processos; Avaliação; Acções correctivas; Melhoria contínua.

Constitui objectivo geral deste trabalho teórico, tendo como referência a nova norma NP EN ISO 9001:2000, apresentar sob a forma de proposta, uma nova cultura de prestação de serviço público entre os órgãos autárquicos e entre estes e o Cidadão, assente numa perspectiva:

  • Tangível; Responsabilidade; Gestão empreendedora; Promoção da Qualidade nos Serviços; Melhoria da comunicação interna e externa na Organização; Dinâmica humana; Promoção da eficiência e eficácia; Interactividade; Inovação; Enfoque no Cidadão;

Numa Autarquia Municipal porque a sua missão é substancialmente diferente embora existam em algumas situações de convergência com o sector privado, o modelo de Gestão da Qualidade que irá ser desenvolvido estará em conformidade com a legislação vigente. Enunciam-se no quadro que se segue algumas comparações;

Figura 1 – Comparação de conceitos entre o sector privado e uma autarquia

 

Sector Privado

Autarquia Local

Observações

Há concorrência

Não se aplica

Não disputa serviços entre juntas. Pode admitir-se acções de

Benchmarking

Satisfação dos Clientes

Aplicável

O conceito de Cliente ainda não se encontra claramente

definido. Existe divergência de opiniões. (1)

Fidelização do Cliente

Não se aplica

O cidadão não pode escolher outra. Não existe alternativa. Este

está afecto à junta que administra a sua área de residência.

Criação de Mais-Valia económica

Não se aplica

A eficiência económica é condicionada pela efectividade

das políticas orçamentais e programas públicos oriundos do

Governo

Satisfazer os accionistas

Não se aplica

Pode remeter para a satisfação do Cidadão numa

perspectiva política (?)

Aumento da produtividade

 

Pode-se considerar o aumento da eficiência e eficácia

do serviço

Oferecer produtos ou serviços de qualidade superior

Aplicável

Válido apenas para a oferta de serviços

Incentivo à comunicação interna de novas ideias e sugestões

Aplicável

Este pressuposto pode ser aplicável enquadrado

numa futura política por objectivos e resultados

Preservação ambiental

Aplicável

Pressuposto aplicável por esta organização ter

responsabilidades na preservação do ambiente

Respeito pelos valores sociais

Aplicável

Acções centradas na promoção da cidadania

Gerar lucro

Prossecução do bem publico

O lucro não e apanágio das entidades municipais

 

Torna-se um desafio interessante desenvolver este trabalho face às variáveis anteriormente referidas, procurando apresentar um modelo conceptual de gestão, tendo como referencial a mesma norma que se aplica ao sector público e privado mas com uma missão e objectivos divergentes. Verificámos neste quadro que os objectivos que se encontram indicados a vermelho são aqueles que o sector privado “mais aprecia”. Para as organizações privadas o processo de certificação muitas vezes é encarado como um meio de desenvolvimento e de permanência activa no mercado assim como o uso da certificação como meio estratégia de marketing (mais á frente indicam-se algumas advertências a considerar). No entanto o mais importante para a tutela é - a geração de lucro. Toda a dinâmica de gestão é conducente ao alcance deste objectivo.

Numa Autarquia existe o princípio da subsidiariedade o que significa que esta se encontra mais próxima dos problemas que requerem soluções para as quais nem sempre existe uma dinâmica na geração de mais valias, como é o caso do lucro, porque a lei o não permite.

Numa prática ela é diferente – na sua missão social de natureza político-partidária, embora sustentada por uma gestão corrente semelhante à que é praticada no sector privado.

Fica a pergunta que no desenvolvimento deste trabalho se procurará dar – Para quê investir na qualidade se temos uma autoridade municipal:

  • Que não precisa de competir;

  • Que gere receitas mais ou menos garantidas;

  • Que detém o monopólio de serviços específicos;

  • Que não é obrigada a apresentar resultados a accionistas;

  • Que tem eleitos que desempenham simultaneamente dois papéis – decisor/gestor e de responsável “político-partidário”;

  • Que tem eleitos locais que a integram e que sobrepõem os interesses políticos aos da comunidade;

  • Que não tem objectivos de gestão a cumprir

Nos capítulos que se seguem, tentar-se-á demonstrar que uma estratégia de gestão no caminho da Qualidade Total (QT) que representa um investimento com benefícios para ambas as partes em particular para o Cidadão. No entanto convém ter em advertência que:

  • uma certificação pela NP EN ISO 9001:2000 não significa, necessariamente, a plena satisfação de quem adquire um serviço. Quando uma organização é certificada, demonstra aos seus clientes a estruturação do seu sistema de gestão da qualidade o que significa, que possui um conjunto de processos conducentes à realização de um serviço, estruturadas de tal maneira que é capaz de assegurar um nível de qualidade constante;

  • o Cidadão, ao adquirir/usufruir um serviço nesta organização, saberá que ao fazê-lo adquire ou usufrui de algo que é o resultado de um processo sob controle e portanto, quando ele precisar novamente, terá assegurada a manutenção de sua satisfação. A certificação por si só não garante a qualidade do serviço;

  • a certificação do sistema da qualidade da organização não significa que ela tenha qualidade total. Este é um sistema que, além de outros aspectos, envolve a gestão de uma organização de maneira integrada e participativa, com todos os seus "agentes": clientes externos (Cidadãos; Fornecedores; Câmara Municipal, etc.) e clientes internos (Funcionários e eleitos locais) todos eles deve ter e manter uma conduta da confiança no sucesso do empreendimento;

  • que em termos de satisfação de clientes, a norma ISO NP EN ISO 9001:2000 designa que é preciso ter procedimentos para controle do serviço. Quando alcança esse objectivo, alcançamos apenas parte deste requisito da norma. É preciso que além dos tais procedimentos, exista um “canal aberto” para uma participação activa dos cidadãos residentes na autarquia, ao fazê-lo está a agir dentro dos princípios da QT;

  • nenhuma organização possui QT sem antes ter um SGQ estruturado. Falar em QT sem ter os processos, que interagem directa ou indirectamente sobre o resultado (Serviço), de forma estruturada, é agir caoticamente. Desta maneira, a organização que busca no limite a Excelência nos seus serviços deve ter atenção dois aspectos: um primeiro, em planear e sustentar as acções para formalizar o seu SGQ(neste trabalho é dado adquirido que a implementação de m SGQ constitui um interesse estratégico da organização) e uma segunda que, seguindo estes passos, garantimos uma uniformidade nos serviços, a manutenção do atendimento e resposta às necessidades e expectativas do Cidadão, tornando a organização (autarquia) voltada para a comunidade.

 

Foi referido o termo Cidadão, afinal quem é esta entidade jurídica – que são os Clientes da Autarquia?

O conceito de Cidadão-Utente ou Cidadão-Cliente pode ter duas interpretações diferentes. Ambas fazem sentido, mas em que uma não pode substituir a outra e a escolha de uma em detrimento da outra pode deixar incompleta a aplicação do conceito de Cliente, vejamos:

  • Cidadão-Utente – momento em que o Cidadão usufrui de um bem público sob a responsabilidade da autarquia; jardim, parque infantil, fontanário, estrada, etc;

  • Cidadão-Cliente – momento em que o Cidadão paga um serviço prestado pela autarquia; obtenção de licenças, contribuição autárquica, frequência de creche, estadia em lar para a 3ª Idade, etc.

Face ao exposto será que ambos os conceitos devem ser utilizados dependendo apenas a sua aplicabilidade do âmbito em que se inserem? Ou deverá existir apenas um único conceito? Ou um novo que integre ambos?

Sugere-se que o termo Cidadão por ser mais abrangente, seja substituído pelo termo Munícipe. Ser Cidadão regista-se em qualquer local de Portugal, Munícipe, apenas na área em que se reside. A essência deste trabalho tem enfoque no Utente por isso o termo surge mais próximo daquele a quem a mais-valia de um Sistema de Gestão da Qualidade irá abranger.

Como o referencial normativo deste trabalho preza o uso do conceito de Utente, usar-se-á o termo Munícipe-Utente.

 

2 - AUTARQUIAS LOCAIS

 

1.1 - Introdução

Devido á extensão da lei (Lei 5-A/2002)9 que estabelece o regime jurídico do funcionamento dos órgãos das freguesias, e dos municípios, apresentam-se apenas alguns princípios gerais, atribuições e competências. Será explicado através de um esquema e organigramas a estrutura do órgão, objecto de “estudo de caso

 

2.2 - Enquadramento Legislativo – Princípios gerais

A organização democrática do Estado compreende a existência das autarquias locais.

As autarquias locais são pessoas colectivas, dotadas de órgãos representativos, que visam a prossecução de interesses próprios das populações respectivas.

As autarquias locais são no continente, as freguesias10, os municípios e as regiões administrativas11. Nas Regiões Autónomas apenas os dois primeiros existem.

O Princípio da autonomia local compreende:

  • Património e finanças próprios;

  • Uma assembleia eleita dotada de poderes deliberativos e um órgão executivo colegial perante ele responsável;

  • Poder regulamentar próprio nos limites da Constituição, das leis e dos regulamentos emanados das autarquias de grau superior ou das autoridades com poder tutelar;

  • A existência de quadros de pessoal próprios.

A descentralização administrativa efectua-se mediante a transferência de atribuições e competências para as autarquias locais12, tendo por finalidade assegurar o reforço da coesão nacional e da solidariedade inter-regional e promover a eficiência e eficácia da gestão pública, assegurando os direitos dos particulares.

As autarquias locais intervêm de acordo com o princípio da subsidiariedade das suas funções em relação ao Estado.

Os órgãos das autarquias são independentes no âmbito da sua competência e as suas deliberações só podem ser suspensas, modificadas, revogadas ou anuladas pela forma prevista na lei13.

Os órgãos das autarquias locais só podem deliberar no âmbito da sua competência e para a prossecução das atribuições cometidas às autarquias locais.

Os órgãos representativos da freguesia são a Assembleia de Freguesia e a Junta de Freguesia – na freguesia – e a Câmara Municipal e a Assembleia Municipal – no município14.

Daqui em diante o enfoque será feito relativamente á Freguesia, visto ser aqui objecto de estudo de caso, em particular.

 

 

    1. - Os Órgãos da Freguesia

    2.  

 

 

 

 

Na figura seguinte é apresentado a estrutura dos órgãos que gerem a freguesia.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Figura 2 – Estrutura típica dos órgãos de uma freguesia

 

 

 

 

 

No âmbito da Junta de Freguesia de Castelo, este órgão é composto por 5 eleitos15, sendo um o Presidente16 e os restantes quatro vogais17, com as funções que se indicam no organigrama que se segue;

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Figura 3 – Organigrama do órgão da junta de freguesia

 

 

1.3.1 - Atribuições18 da Freguesia

 

No que diz respeito aos interesses próprios, comuns e específicos das populações designadamente quanto às:

 

 

Atribuições

Equipamento urbano e rural;

Abastecimento público;

 

À educação;

Cultura, tempos livres e desporto;

Cuidados primários de saúde;

Acção social;

Protecção civil;

Ambiente e salubridade;

Desenvolvimento;

Ordenamento urbano e rural;

À protecção da comunidade;

 

 

 

 

 

1.3.2 – Competências19 da Junta (Presidente + Vogais)

Compete também à junta de freguesia no âmbito da:

 

Organização – Funcionamento - Gestão Corrente

Executar e velar pelo cumprimento das deliberações da assembleia de freguesia ou do plenário dos cidadãos eleitores.

Gerir os serviços da freguesia.

Gerir os recursos humanos ao serviço da freguesia.

Administrar e conservar o património da freguesia.

Elaborar e manter actualizado o cadastro dos bens móveis e imóveis da freguesia.

Adquirir ou adquirir os bens móveis necessários ao funcionamento dos serviços e alienar os que se tornem dispensáveis.

 

 

No âmbito do:

 

 

Planeamento e Gestão financeira

Elaborar e submeter a aprovação da assembleia de freguesia as opções do plano e a proposta do orçamento.

Elaborar e submeter a aprovação da assembleia de freguesia as revisões às opções do plano e ao orçamento.

Executar as opções do plano e orçamento, bem como aprovar as suas alterações.

Elaborar e aprovar a norma de controlo interno, quando aplicável nos termos da lei, bem como o inventário de todos os bens, direitos e obrigações patrimoniais e respectiva avaliação e ainda os documentos de prestação de contas, a submeter à apreciação do órgão deliberativo.

Remeter ao Tribunal de Contas, nos termos da lei, as contas da freguesia.

 

 

No âmbito do:

 

 

Ordenamento do território e urbanismo

Participar, nos termos a acordar com a câmara municipal, no processo de elaboração, inquérito e facultar a consulta pelos interessados dos planos municipais de ordenamento do território

Executar, por empreitada ou administração directa, as obras que constem das opções do plano e tenham dotação orçamental adequada nos instrumentos de gestão previsional, aprovados pelo órgão deliberativo

 

1.3.3 – Competências do Presidente da Junta

 

Presidente da Junta

Elaborar a ordem do dia, convocar, abrir e encerrar as reuniões, dirigir os trabalhos e assegurar o cumprimento das leis e a regularidade das deliberações;

Responder, no prazo máximo de 30 dias, aos pedidos de informação formulados pelos membros da assembleia de freguesia através da respectiva mesa

Submeter a norma de controlo interno, quando aplicável nos termos da lei, bem como o inventário de todos os bens, direitos e obrigações patrimoniais e respectiva avaliação e ainda os documentos de prestação de contas, à aprovação da junta de freguesia e à apreciação e votação da assembleia de freguesia, com excepção da norma de controlo interno;

Submeter a visto prévio do Tribunal de Contas, quando for caso disso, os documentos elaborados na junta de freguesia ou em que a freguesia seja parte, que impliquem despesa:

Assinar, em nome da junta de freguesia, toda a correspondência, bem como os termos, atestados e certidões da competência da mesma;

Determinar a instrução dos processos de contra-ordenação e proceder à aplicação das coimas nos termos da lei, com a faculdade de delegação em qualquer dos restantes membros

A certificação, mediante despacho do presidente, dos factos e actos que constem dos arquivos da freguesia e, independentemente de despacho, o conteúdo das actas das reuniões da junta

A subscrição dos atestados que devam ser assinados pelo presidente

A execução do expediente da junta

A arrecadação das receitas, o pagamento das despesas autorizadas e a escrituração dos modelos contabilísticos da receita e da despesa, com base nos respectivos documentos que são assinados pelo presidente

 

 

 

1.4 – Órgãos da Assembleia de Freguesia

 

Composta por 13 Deputados locais20 (neste caso), estruturados do seguinte modo:

 

 

Figura 4 – Organigrama da assembleia de freguesia

 

 

1.4.1 – Assembleia de Freguesia

A assembleia de freguesia é o órgão deliberativo da freguesia.

 

1.4.2 – Competências da Assembleia de Freguesia

Temos assim para a Assembleia de Freguesia as seguintes:

 

Competências

Eleger, por voto secreto, os vogais para o órgão executivo- junta de freguesia, o presidente e os secretários para a mesa da assembleia de freguesia;

Elaborar, redigir, submeter a apreciação e aprovar o seu regimento

Deliberar sobre recursos interpostos de marcação de faltas injustificadas aos seus membros;

Acompanhar e fiscalizar a actividade da junta, sem prejuízo do exercício normal da competência desta;

Deliberar sobre a constituição de delegações, comissões ou grupos de trabalho para estudo de problemas relacionados com o bem-estar da população da freguesia, no âmbito das atribuições desta e sem interferência na actividade normal da junta;

Solicitar e receber informação, através da mesa, sobre assuntos de interesse para a freguesia e sobre a execução de deliberações anteriores, a pedido de qualquer membro em qualquer momento;

Apreciar a recusa, por acção ou omissão, de quaisquer informações e documentos, por parte da junta de freguesia ou dos seus membros, que obstem à realização de acções de acompanhamento e fiscalização;

Estabelecer as normas gerais de administração do património da freguesia ou sob sua jurisdição;

Aceitar doações, legados e heranças a benefício de inventário;

Discutir, a pedido de quaisquer dos titulares do direito de oposição, o relatório a que se refere o Estatuto do Direito de Oposição;

Conhecer e tomar posição sobre os relatórios definitivos, resultantes de acções tutelares ou de auditorias executadas sobre a actividade dos órgãos e serviços da freguesia;

Apreciar, em cada uma das sessões ordinárias, uma informação escrita do presidente da junta acerca da actividade por si ou pela junta exercida, no âmbito da competência própria ou delegada, bem como da situação financeira da freguesia, informação essa que deve ser enviada ao presidente da mesa da assembleia, com a antecedência de cinco dias sobre a data de início da sessão;

Votar moções de censura à junta de freguesia, em avaliação da acção desenvolvida pela mesma ou por qualquer dos seus membros, no âmbito do exercício das respectivas competências;

Aprovar referendos locais, sob proposta, quer de membros da assembleia, quer da junta, quer da câmara municipal, quer dos cidadãos eleitores, nos termos da lei;

Pronunciar-se e deliberar sobre todos os assuntos com interesse para a freguesia, por sua iniciativa ou por solicitação da junta;

Aprovar as opções do plano, a proposta de orçamento e as suas revisões;

Apreciar o inventário de todos os bens, direitos e obrigações patrimoniais e respectiva avaliação, bem como apreciar e votar os documentos de prestação de contas;

Autorizar a junta a contrair empréstimos de curto prazo e a proceder a aberturas de crédito, nos termos da lei;

 

Aprovar as taxas da freguesia e fixar o respectivo valor nos termos da lei;

Autorizar a freguesia a participar em empresas de capitais públicos de âmbito municipal, para a prossecução de actividades de interesse público ou de desenvolvimento local, cujo objecto se contenha nas atribuições da freguesia;

Autorizar a freguesia a associar-se com outras, nos termos da lei;

Autorizar a freguesia a estabelecer formas de cooperação com entidades públicas ou privadas, no âmbito das suas atribuições;

Autorizar expressamente a aquisição, alienação ou oneração de bens imóveis de valor superior ao limite fixado para a junta de freguesia, fixando as respectivas condições gerais, que podem incluir, nomeadamente, a hasta pública;

Aprovar posturas e regulamentos;

Aprovar, nos termos da lei, os quadros de pessoal dos diferentes serviços da freguesia, os quadros de pessoal dos diferentes serviços da freguesia;

Autorizar a concessão de apoio financeiro, ou outro, às instituições legalmente constituídas pelos funcionários da freguesia, tendo por objecto o desenvolvimento de actividades culturais, recreativas e desportivas;

 

1.4.3 – Competências da Mesa da Assembleia de Freguesia

A mesa da assembleia de freguesia é composta pelo presidente que é simultaneamente presidente da assembleia de freguesia e por dois secretários. Cabe a estes coadjuvar o presidente da mesa da assembleia de freguesia, assegurar o expediente e, na falta de funcionário nomeado para o efeito, lavrar as actas das reuniões.

Quanto ás suas competências da Mesa temos o seguinte:

 

Competências

Elaborar a ordem do dia das sessões e proceder à sua distribuição;

Deliberar sobe as questões de interpretação de integração de lacunas do regimento;

 

Encaminhar, em conformidade com o regimento, as iniciativas dos membros da assembleia e da junta de freguesia;

Comunicar à assembleia de freguesia as decisões judiciais relativas à perda de mandato em que incorra qualquer membro;

Dar conhecimento à assembleia de freguesia do expediente relativo aos assuntos relevantes;

 

Proceder à marcação e justificação de faltas dos membros da assembleia de freguesia;

Exercer os demais poderes que lhe sejam cometidos pela assembleia de freguesia.

 

 

1.4.4 – Competências do Presidente da Assembleia de Freguesia

Constituem competências do presidente o seguinte:

 

Competências

Representar a assembleia, assegurar o seu regular funcionamento e presidir aos seus trabalhos

Convocar as sessões ordinárias e extraordinárias e elaborar a ordem do dia das sessões e proceder à sua distribuição;

Abrir e dirigir os trabalhos mantendo a disciplina das reuniões

Assegurar o cumprimento das leis e a regularidade das deliberações

Suspender ou encerrar antecipadamente as reuniões, quando circunstâncias excepcionais o justifiquem, mediante decisão fundamentada, a incluir na acta da reunião;

Comunicar à junta as faltas do seu presidente ou do substituto legal, às reuniões da assembleia de freguesia e posteriormente participar ao Ministério Público

Exercer os demais poderes que lhe sejam cometidos por lei, pelo regimento interno ou pela assembleia.

 

 

 

1.4.5 – Competências dos membros da Mesa da Assembleia de Freguesia

Os membros, dentro do seu âmbito de competências devem na medida do possível atenuar as suas convicções políticas e trabalhar conjuntamente para satisfazer os interesses e expectaivas de todos os Fregueses. Ao nível das competências que lhes estão atribuídas devem fazê-lo no decorrer das reuniões da assembleia e através comissões criadas para trabalharem sobre um assunto específico.

 

1.5 – Resumo

A gestão da freguesia é feita na base das competências que a(s) lei(s) atribui(em) aos dois órgãos. Entre ambos existem um conjunto de regulamentos e modos de proceder e são estes que irão ser alvo de tratamento e apreciação no capítulo seguinte. Constituiu objectivo deste capítulo, explicar o modo como opera a Freguesia no seu todo. Assim, poder-se-á perceber melhor de que modo se pode melhorar os “processos” internos e externos sabendo as competências e o seu âmbito de acção.

 

CONCLUSÕES

A Qualidade Municipal afigura-se como um imperativo dos tempos modernos, exercido sobre os órgãos municipais pelos cidadãos cujo nível de exigência já á muito vem sendo aculturado por padrões oriundos do sector privado, rumo à melhoria contínua. Afinal “ Se puede reafirmar que la democracia es un proceso sin término.”21

O cidadão no seu papel de utente tem um outro tipo de exigências perante uma administração, nem sempre eficiente, diferente daquele que terá enquanto cliente de uma organização que preste serviços e ou produtos, que ele consumirá ou não.

Como Utente o cidadão não tem escolha, não pode optar por aceder a produtos ou serviços alternativos. Assim as responsabilidades da Administração são enormes, e passam inevitavelmente, pela satisfação integral do seu utente. Esta dicotomia Utente versus Cliente faz toda a diferença, para quem, ao nível da modernização administrativa, por um lado, e a participação democrática das populações, junto de quem os serve, por outro pretende dar um contributo para a participação de todos na administração de todos, afinal é sempre o bem geral, a prossecução do bem público que anima a administração municipal, pois “Como siempre, también es una condición del desarrollo de la participación crear una Administración más p+roxima al ciudadano.22

Os sistemas de gestão da qualidade, utilizando como referencial a ISO 9001:2000, são um contributo importante para este desiderato. As cautelas com as adaptações às especificidades da administração municipal têm de ser tomadas. O sector público distingue-se do privado por atender a necessidades sociais que o privado não assegura e este só visa o lucro dos seus investimentos, ao contrário do que sucede no sector público, onde o lucro não tem presença.

Mas não só a Qualidade. Na verdade outros sistemas de gestão existem, como é caso do Ambiente23 e da Higiene e Segurança no Trabalho24, que sendo utilizados de forma integrada com a Qualidade, dão origem à utilização de ferramentas organizacionais poderosas, com os inevitáveis ganhos de eficiência da organizações, potenciando assim ganhos de eficácia que fazem a diferença nesta comunidade global em que se transformou a sociedade.

É evidente que o principal beneficiário desta reengenharia organizacional é o cidadão, pois tudo gira à sua volta.

Afinal a diferença entre o passado e o futuro, é que no passado as pessoas existiam para servir as administrações públicas, no futuro as administrações públicas existem para servir as pessoas. Pelo meio fica o presente, e este é o passado do futuro, significando que é no presente que se constrói o futuro.

 

Bibliografia

 

AA.VV, Congresso Ibero-Americano de Municipios, “Crescimienteo Y Desarrollo Urbano del tercer Milenio”, Lisboa, Octubre, 1996

 

BILHIM, João, Ciência da Administração, Lisboa, Edições Universidade Aberta;2000

 

Dias, José António Rajani Oliveira, “A Cartilha do eleito Local”, edições NovaOdivelas, Lisboa, 2000

 

SANTOS, José António, As Freguesias – História e Actualidade, Oeiras, Edições Celta; 1995

 

AA.VV, Estratégia e Planeamento na Gestão e Administração Pública, Lisboa, Edições Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade Técnica de Lisboa,2000

 

PORTO, Manuel,, O Ordenamento do Território Face aos Desafios da Competitividade, Coimbra, Edições Livraria Almedina, 1996;

 

 

 

FIM

 


 

1 De registar que a Direcção Geral da Administração Local tem já concluída uma proposta de código autárquico, mas que não teve ainda qualquer desenvolvimento relativamente a sua apresentação e discussão publica.

2 Assumimos que em Portugal a gestão municipal envolve dois tipos de entidades distintas: o Município e a Freguesia, ambas entidades de caracter municipal.

3 Este tanto pode ser o “cliente” de uma organização como o “utente” de um serviço publico como ambas, como se explicara adiante, no caso português.

4 Millan, Rafael Contreras, Miembro del Tercer Contencioso Administrativo (Venezuela), in Ponencia – Gestion de los servicios publicos locales.

5 idem

6 Cerca de 800.000

7 Olmo, Dr. Felipe Torres Del, Presidente de la Escuela Venezuelana de Administración Pública, in ponencia Política y Democracia en el Municipio, congreso OICI, Lisboa, 2000

8 idem

9 Lei das Autarquias Locais Portuguesas

10 A freguesia é também ela uma entidade de caracter municipal, pois este é aferido, tal como nos municípios, pelas relações vicinais (vizinhança), pela legitimidade própria (eleição em sufrágio universal) e pela autonomia que lhe subjáz.

11 Estas tem consagração constitucional, mas não estão instituídas, afigurando-se, claramente, como uma inconstitucionalidade por omissão.

12 Isto é o instituto jurídico da “devolução de poderes”

13 Por decisões judiciais.

14 Assim e legalmente. Mas na pratica defendemos a existência de dois órgãos executivos unipessoais: o Presidente da Junta d freguesia e o Presidente da câmara municipal.

15 O termo Autarca para designar eleitos locais é frequentemente usado em Portugal, mas é incorrecto. Na realidade o autarca é o substracto pessoal da autarquia da mesma forma que o substracto pessoal de um município é o munícipe, e o substracto pessoal da freguesia é o freguês. Assim para se utilizar o termo Autarca terá sempre de se acrescentar Eleito- Autarca Eleito, pois os demais habitantes são os Autarcas não eleitos.

16 Eleito directamente para a Assembleia de Freguesia, e Presidente da Junta de Freguesia por designação legal, onde exercerá as suas funções assim que os órgãos estejam instalados..

17 Eleitos directamente para a Assembleia de Freguesia e posteriormente, sob proposta do Presidente da junta, objecto de uma eleição (indirecta), de entre os seus pares na Assembleia, para a Junta.

18 As atribuições são os fins ou objectivos gerais de uma entidade.

19 As Competências são os poderes funcionais afectos a um órgão. Em alguns países esta diferença entre atribuições e competências não existe significando a mesma coisa.

20 Em Portugal não é usual identificarem-se os membros da Assembleia de Freguesia como deputados. Apenas os membros da Assembleia Municipal são como tal considerados. Porém qualquer membro com acento numa Assembleia política é um deputado, pelo que também se aplica no caso das Freguesias.

21 Rosario, Julio Mariñezs del, Secretario general de la liga Municipal Dominicana, in ponencia Politica y Democracia en el Municipio, OICI, Lisboa, 2000

22 Moron, Miguel Sanchez, Catedratico de Derecho Administrativo de la Universidad de Alcalá de Henares (Espanha), in ponencia Intervencion ciudadana en la elaboracion y gestion de politicas municipales, congreso OICI, Lisboa, 2000

23 Cuja norma de referência é a ISO 14001:1999

24 Cuja norma de referência é a OSHAS 1800:1999